ENGLISH

 

“FUSO 2017 – 22 a 27 de Agosto

Sobre

 

22 a 27 Agosto
Travessa da Ermida

 

Testemunhas de um Tempo
Curadoria de Solange Farkas
Inauguração 22 Agosto, 22h

 

Desde sua criação, em 1983, o Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil tem estabelecido profícuas parcerias e diálogos com instituições de inúmeros países. Se, no primeiro momento, os nossos parceiros naturais vinham de países latino-americanos – então também realizando os seus primeiros festivais de vídeo –, atualmente eles estão no mundo todo.

Reflexo importante desse momento inicial, a presença de obras e artistas latino-americanos é uma das marcas distintivas do Acervo Histórico Videobrasil. Além disso, atualmente esse acervo é um dos principais guardiães da memória videográfica na América Latina, uma vez que – vítimas dos anos – outras instituições pioneiras desapareceram, levando consigo suas coleções e acervos.

Com obras de Andrés Denegri, Ayrson Heráclito, Cao Guimarães e Enrique Ramírez, o recorte do Acervo Histórico apresentado na atual edição do FUSO busca, num só gesto, lançar luz sobre essa trajetória e indicar os percursos que o Festival projeta para o seu futuro. Não é, contudo, só a proximidade geográfica que estabelece uma identidade entre estas obras. Existe em todas, de maneiras distintas, uma fala sobre a ausência, sobre a perda e sobre a finitude da vida – “o solene sentimento de morte, que floresce no caule da existência mais gloriosa” de que nos fala Carlos Drummond de Andrade.

Contra um fundo político, religioso ou pessoal, essas vozes aproximam-se de nós como animais domésticos, na sua devoção familiar e quotidiana. Aqui, o mar, a morte, o jardim e a cidade estrangeira surgem como instâncias de um lamento por um afeto ou um lugar perdido. Frente a ele, restamos nós, solitárias testemunhas de um tempo que se vai e deixa, sem testamento, a sua herança.

Solange Farkas, São Paulo, 2017

Andrés Denegri, Uyuni, 2005, 8’08”

Em diversos vídeos, Andrés Denegri constrói um universo audiovisual a partir de articulações entre as noções de proximidade e distância. Em Uyuni, essa articulação dá-se entre áudio e imagens: vozes em off de um homem e uma mulher relatam o diálogo de um casal num quarto de hotel em Uyuni, cidade boliviana famosa pela sua proximidade com o Salar. Eles comentam a sua estadia, presos entre o tédio e a espera. O uso do discurso indireto reforça a sensação de distanciamento provocada pelos planos gerais da cidade. Como ruído de fundo, ouvimos trechos de uma rádio peruana, onde uma liderança camponesa fala sobre a preservação dos recursos naturais.


Ayrson Heráclito, Funfun, 2012, 4’08”

A obra é um réquiem para Estelita de Souza Santana, juíza perpétua da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte (Cachoeira, Bahia), morta aos 105 anos. Um mito local que identifica sacerdotisas negras e garças brancas inspira a narrativa, que explora a simbologia relacionada ao branco (“funfun” em iorubá), comummente associado a pureza, maturidade e sabedoria, indicador de luto em países orientais e cor do deus negro Obatalá. A partir dessa profusão de símbolos, o artista cria o seu próprio ritual fúnebre.


Enrique Ramírez, Pacifico, 2014, 2’42”

Pacifico mostra um mar agitado, noturno e, aparentemente, indecifrável. Sem referências que o localizem, é um fragmento indefinido do oceano. Embora tenha admitido a brutalidade das suas ações durante o regime militar de Pinochet, o exército chileno nunca revelou o paradeiro das suas vítimas. A maioria é identificada como tendo sido “atirada ao mar”, ou seja, irrecuperáveis. Em Pacifico, o mar torna-se uma memória que assombra em silêncio a noite da história.


Cao Guimarães, Concerto para Clorofila, 2004, 7’23”

Como um passeio contemplativo, em Concerto para Clorofila a câmara persegue as diferentes formas e cores de um jardim. Detendo-se sobre diversos tipos de plantas e folhas; repara na passagem do sol pelas copas das árvores, nos seus reflexos na água e as analogias formais que os jogos de luz e sombra produzem no espaço. A câmara flana; o seu registo aproxima-se do encantamento curioso, que ora faz lembrar o olhar infantil sobre um mundo recém-conhecido, ora remete à visão subjetiva de um inseto ou pássaro, passeando como se procurasse algo. Delicada, a música composta pelo O Grivo é executada pelo próprio artista, numa espécie de desdobramento musical da mise-en-scène do vídeo.

“FUSO 2017”

Sobre

 

August 22 to 27
Travessa da Ermida

 

Witnesses of a Time (Testemunhas de um Tempo)
Curatorship by Solange Farkas
Opening August 22, 10pm

 

Since its creation in 1983, the Sesc_Videobrasil Contemporary Art Festival has been establishing fruitful partnerships and dialogues with institutions from countless countries. Formerly, if our natural partners came from Latin American countries – also establishing then their first video festivals – our current partners are all over the world.

An important reflection of this initiatory moment, the presence of Latin American works and artists, is one of the distinguishing landmarks of Videobrasil’s historical archive. Moreover, this collection is nowadays one of the main holders of videographic memory in Latin America, since other pioneer institutions – victims of the passing years – have disappeared along with their collections and archives.

With works by Andrés Denegri, Ayrson Heráclito, Cao Guimarães and Enrique Ramírez, this selection of Videobrasil’s historical archive seeks, in a single gesture, to highlight this trajectory while outlining the paths the Festival designs for its future. However, it is not only the geographical proximity that establishes an identity between these works. Each of them includes, in its own distinct way, an evocation of absence, loss, and finitude of life – “the solemn feeling of death, which blossoms on the stem of the most glorious existence” of which Carlos Drummond de Andrade speaks.

Against a political, religious or personal background, these voices approach us as domestic animals, in their familiar and daily devotion. Here, the sea, death, the garden and the foreign city arise as instances of a lament for affection or a lost place. And we remain solitary witnesses of a time that goes away and leaves, without testament, its inheritance.

Solange Farkas, São Paulo, 2017

Andrés Denegri, Uyuni, 2005, 8’08”

In several of his videos, Andrés Denegri constructs an audiovisual universe based on articulations between the notions of proximity and distance. In Uyuni, this articulation takes place between sound and image: voice-overs of a man and a woman tell a couple’s dialogue in a hotel room in Uyuni, a Bolivian city famous for its proximity to Salar. They talk about their stay, imprisoned between boredom and waiting. The use of indirect speech reinforces the sense of detachment provoked by the city’s long shots. As background noise, we hear excerpts from a Peruvian radio, where a peasant leadership talks about the preservation of natural resources.


Ayrson Heráclito, Funfun, 2012, 4’08”

This work is a requiem for Estelita de Souza Santana, lifetime leader of the Sisterhood of Nossa Senhora da Boa Morte from Cachoeira, Bahia, who passed away at the age of 105. A local myth identifying black priestesses and white herons inspires the narrative, which explores the symbolism related to the white colour (“funfun” in Yoruba), commonly associated with purity, maturity and wisdom, indicator of mourning in the East and the colour of black god Obatalá. From this profusion of symbols, the artist creates his own funeral ritual.


Enrique Ramírez, Pacifico, 2014, 2’42”

Pacifico shows a turbulent, nocturnal and apparently indecipherable sea. Without references tracking it, it is an indefinite fragment of the ocean. The Chilean army, while admitting the brutality of its actions during Pinochet’s military regime, never revealed the whereabouts of its dead victims. Most are identified as having been “thrown into the sea”, that is, unrecoverable. In Pacifico, the sea becomes a memory that haunts in silence the night of history.


Cao Guimarães, Concerto para Clorofila, 2004, 7’23”

As a contemplative walk, in Concerto para Clorofila the camera chases the different shapes and colours of a garden. Dwelling on various types of plants and leaves, notices the passage of the sun through the treetops, its reflections in the water, and the formal analogies that light and shadow plays produce in space. The camera strolls; its record becoming a curious enchantment, now resembling the infantile gaze on a world just recently known, now referring to the subjective vision of an insect or a bird, pacing as if seeking something. Delicate, the soundtrack composed by O Grivo is performed by the artist himself, in a sort of musical unfolding the mise-en-scène of the video.