FUSO 2025 – 26 a 31 de Agosto
30 Agosto, 22h00
Palácio Galveias
Bienal Walk&Talk — Gestos de Abundância
Claire Shea, Fátima Bintou Rassoul Sy, Jesse James e Liliana Coutinho
Apresentada pela Bienal Walk&Talk (Açores), esta sessão propõe uma viagem audiovisual por práticas artísticas que se debruçam sobre territórios em transformação — geográficos, afetivos, espirituais, ecológicos e políticos. A seleção parte do tema da bienal de 2025, Gestos de Abundância, que desafia a perceção de escassez e reivindica práticas de comunalidade, interdependência e criação de mundos.
Quatro obras, quatro gestos distintos, traçam percursos entre a memória e o mito, a denúncia e o sonho, a terra e o corpo. Ecotone (Enar de Dios Rodríguez) propõe um ensaio visual sobre fronteiras e sistemas de controlo, entrelaçando natureza e cultura numa reflexão crítica sobre migração vegetal, agricultura extensiva e colonialismo, revelando o “desastre lento” causado pelos usos capitalistas da terra. Em Aclarar (Isabel Medeiros), a memória da erupção do Vulcão dos Capelinhos transforma-se num gesto fílmico onde imagem e arquivo explodem em simultâneo — uma exploração sensível da materialidade do esquecimento e do próprio tremor. Portal (Jane Jin Kaisen) invoca uma mitologia insular e cosmológica, dissolvendo as fronteiras entre pedra e pele, corpo e paisagem, num fluxo de imagens que pulsa como matéria viva e poética. A fechar, Soy Much (Soya the Cow) explode num manifesto queer camp que celebra a liberdade, a autoexpressão e a abundância dos corpos não normativos — humanos e não humanos.
Esta sessão traça linhas de afinidade que são simultaneamente concetuais e sensoriais: todas as obras envolvem um gesto de deslocamento e de escavação, seja do território, do arquivo, da linguagem ou do corpo. Há uma escuta atenta ao mundo natural e às suas camadas simbólicas, uma vontade de reencantar o olhar e de provocar fricções entre crítica e afeto. As geografias são diversas — dos Açores à Coreia, da Catalunha à Suíça —, mas os gestos tocam-se na procura de um cinema que expande a imagem como pensamento poético e político.
Aclarar – Isabel Medeiros
Aclarar parte das memórias dos avós da realizadora, que viveram a erupção do Vulcão dos Capelinhos, na ilha do Faial, em 1957. Mais do que reconstituir esse acontecimento histórico, o filme centra-se na natureza lacunar e mutável da memória, explorando o esquecimento pessoal em paralelo com a transformação da paisagem e com o efeito do tempo sobre os arquivos físicos da erupção — nomeadamente o crescimento de fungos. O arquivo é aqui utilizado não como base narrativa, mas como vestígio do esquecimento, propondo uma metáfora em que o esquecimento se manifesta como um fungo. O filme emerge no contexto de uma investigação artística desenvolvida entre 2020 e 2023, no âmbito do mestrado em Estética e Estudos Artísticos, com especialização em Cinema e Fotografia.
Ecotone – Enar de Dios Rodríguez
Ecotone é um ensaio audiovisual sobre zonas-limite e as práticas de controlo exercidas sobre os espaços com o objetivo de manter a sua separação. Estruturado como um conjunto de campos organizados por escala — desde vastas áreas naturais até espaços corporais minúsculos — Ecotone constitui uma crítica às formas contemporâneas de capitalismo, como o capitalismo de vigilância e o biocapitalismo. Através de uma ampla diversidade de materiais visuais, o filme procura ativar potencialidades relacionais, ao mesmo tempo que evidencia as interseções entre aspetos económicos, políticos, históricos e ambientais.
Portal – Jane Jin Kaisen
Portal regista a vivacidade do ser e da criação a partir de um espaço de totalidade. É inspirado no mito xamânico fundador de Jeju, que narra a história da deusa gigante Seolmundae Halmang — simultaneamente criadora do mundo e parte integrante do próprio mundo e dos elementos que impulsionam toda a vida. Em Portal, a ilha e o mar tornam-se entidades interligadas em transformação contínua. Filmado na zona entremarés, as fendas nas densas formações rochosas de lava azul-escura surgem como portais para o interior de conchas e criaturas marinhas, que se revelam como micro-universos em movimento, pulsação e respiração vitais. A orientação escalar é suspensa pelo fluxo rítmico e contínuo de imagens que ressoam como poesia visual. Dissolvem-se as distinções entre o eu e o outro, entre o interior e o exterior. Formas e texturas habitualmente invisíveis ao olhar humano revelam-se, evocando associações com a matéria corporal e cósmica. No limiar da linguagem e da construção de sentido, Portal convoca um espaço de potência e poesia, de vitalidade e criação.
Soy Much – Soya the Cow
Soy Much é uma música pop interpretada por Soya the Cow — a vaca drag vegana e sex-positive — que celebra a abundância queer, o amor-próprio e a liberdade de existir para além das normas. Com uma estética vibrante e marcada pelo camp, o videoclipe encena um universo onde corpos dissidentes prosperam, desafiando convenções de género, beleza e espécie. Misturando humor, desejo e crítica política, Soy Much afirma-se como um manifesto lúdico e poderoso pela libertação de todos os corpos — humanos e não humanos — transformando a vaca sagrada num ícone queer do nosso tempo.
FUSO 2025 – August 27th to 31st
August 30, 10pm
Palácio Galveias
Walk&Talk Biennial — Gestures of Abundance
Claire Shea, Fátima Bintou Rassoul Sy, Jesse James e Liliana Coutinho
Presented by Walk&Talk Biennial (Azores), this screening invites viewers on an audiovisual journey through artistic practices that explore shifting territories — geographic, affective, spiritual, ecological, and political. The selection is rooted in the theme of the 2025 biennial, Gestures of Abundance, which challenges the perception of scarcity and reclaims practices of communality, interdependence, and world-making.
Four works, four distinct gestures trace pathways between memory and myth, critique and dream, land and body. Ecotone (Enar de Dios Rodríguez) presents a visual essay on borders and systems of control, weaving nature and culture into a critical reflection on plant migration, large-scale agriculture, and colonialism, exposing the “slow disaster” caused by the capitalist exploitation of land. In Aclarar (Isabel Medeiros), the memory of the Capelinhos volcanic eruption becomes a cinematic gesture where image and archive erupt simultaneously — a sensitive exploration of the materiality of forgetting and the tremor itself. Portal (Jane Jin Kaisen) invokes an insular and cosmological mythology, dissolving the boundaries between stone and skin, body and landscape, in a flow of images that pulses as living and poetic matter. Closing the program, Soy Much (Soya the Cow) bursts into a queer camp manifesto celebrating freedom, self-expression, and the abundance of non-normative bodies — both human and non-human.
This session draws lines of affinity that are both conceptual and sensorial: each work involves a gesture of displacement and excavation — of territory, of archive, of language, or of the body. There is a deep attentiveness to the natural world and its symbolic layers, a desire to re-enchant perception and to provoke friction between critique and affection. The geographies are diverse — from the Azores to Korea, from Catalonia to Switzerland — yet these gestures converge in their pursuit of a cinema that expands the image as poetic and political thought.
Enlighten – Isabel Medeiros
Enlighten draws from the memories of the filmmaker’s grandparents, who experienced the eruption of the Capelinhos Volcano on the island of Faial in 1957. Rather than reconstructing this historical event, the film focuses on the fragmented and mutable nature of memory, exploring personal forgetfulness in parallel with the transformation of the landscape and the effects of time on the physical archives of the eruption—namely, the growth of fungi. In this context, the archive is not used as a narrative source, but as evidence of forgetting, proposing a metaphor in which oblivion materializes as fungus. The film emerged from an artistic research project developed between 2020 and 2023, within the master’s program in Aesthetics and Artistic Studies, with a specialization in Cinema and Photography.
Ecotone – Enar de Dios Rodríguez
Ecotone is an audiovisual essay about borderlands and the practices of control that are exerted over spaces in order to maintain their separation. Structured as a set of fields arranged according to scale (from vast natural areas to minute bodily spaces), Ecotone is a critique of current forms of capitalism, such as surveillance capitalism and biocapitalism. Using a wide range of visual materials, Ecotone aims to activate potential relationalities while demonstrating how economic, political, historical and environmental aspects intersect with each other.
Portal – Jane Jin Kaisen
Portal registers the vivacity of being and creation from a space of wholeness. It is informed by the shamanic progenitor myth of Jeju about the giant goddess Seolmundae Halmang who is both the creator of the world and is the world and the elements that propel all life. In Portal, the island and the sea become continuously morphing interconnected entities. Filmed in the inter-tidal zone, crevices in the dense blue-black rugged lava rock formations become portals into the interior of sea shells and sea creatures become micro universes, moving, pounding, and breathing with life. Scalar orientation is suspended with the continuous rhythmic flow of images that resonate as visual poetry. Distinctions dissolve between self and other, inside and outside. Shapes and textures not ordinarily visible to the human eye reveal themselves and carry associations of bodily and cosmic matter. At the threshold of language and sensemaking, Portal invokes a space of potency and poetry, of vitality and creation.
Soy Much – Soya the Cow
Soy Much is a pop song performed by Soya the Cow — the sex-positive, vegan drag cow — celebrating queer abundance, self-love, and the freedom to exist beyond norms. Set within a vibrant, camp-infused aesthetic, the video stages a universe where dissident bodies thrive, challenging conventions of gender, beauty, and species. Blending humor, desire, and political critique, Soy Much stands as a playful yet powerful manifesto for the liberation of all bodies — human and non-human alike — turning the sacred cow into a queer icon for our times.