“A VISÃO INCORPORADA – PERFORMANCE PARA A CÂMARA”

Ana Rito, Jacinto Lageira

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O corpo é redesenhado constante e profundamente, através das imagens que a partir dele são criadas e que de alguma forma, devolvem o reflexo, transformando-o a cada olhar. Este corpo atravessa conceitos, experiencia a teatralidade, a encenação, a coreografia, o gesto, o movimento e coloca-se em rota de colisão com qualquer tentativa de codificação mais clássica.


O paradoxo estabelece a natureza transmutável e instável do corpo e das suas imagens. O corpo-videográfico ou cinemático estabelece uma teia de relações que se prendem com uma noção de espelho, onde conceitos como a identidade, o género, o duplo ou a máscara são trabalhados segundo uma lógica de (des)construção. Giorgio Agamben afirma no seu ensaio
Notes on Gesture que o elemento do cinema é o gesto e não a imagem. Ora, é precisamente entre os dois que estabelecemos a nossa reflexão. Situamo-nos no intervalo entre o corpo e uma sua imagem, observando os momentos de transição, de contato, de suspensão, de cruzamento e de hesitação. A projeção da imagem do corpo performativo no espaço da vídeo-instalação, constitui a génese da nossa investigação/exposição. Fazendo da imagem matéria primordial de reflexão, é concebido um projeto expositivo que pretende estabelecer a sua génese operativa a partir de um enunciado que reflita sobre a presença e a ausência do corpo. Em A Visão Incorporada, é a imagem videográfica ou cinemática que, registando o corpo, edifica o conceito de “performance para a câmara”, não pressupondo que as ações sejam experienciadas ao vivo por um público, logo permitindo um desfasamento conceptual que auxilia a definição de um campo esquivo e entre mundos: os gestos são agora “arquivos” do corpo em trânsito. A figura, agora tornada, o corpo da imagem (podemos talvez considerar dois corpos unidos, o corpo enquanto figura, e o corpo próprio do vídeo ou do filme enquanto representação, “objeto”), estabelece a transmutação e a instabilidade da própria condição do medium das imagens em movimento – filme ou vídeo. Procurando então um discurso transdisciplinar entre o corpo e uma sua imagem, o presente projeto de investigação estabelece um lugar e uma linguagem nas fronteiras das classificações, dos códigos e dos modelos. Questionando frequentemente sobre que desconhecido, que outro, pode emergir dos encontros entre a prática da performance, da dança contemporânea, do teatro e a experiência cinemática, encontra-se uma possível resposta no espaço da vídeo-instalação e na hibridez manifesta nesse processo de metamorfose, nos interstícios das formas, nos intervalos dos corpos. Interessa, por exemplo, a transição do universo da performance para o universo videográfico, o corpo em movimento em diálogo com a linguagem cinematográfica, numa ressonância essencial e contínua. É no estudo e análise das estruturas inerentes ao filme e ao vídeo, nas suas dimensões percetivas e cognitivas, que se intui uma noção de espacialidade transformadora da postura do espectador relativamente ao espaço físico e arquitetural. O questionamento do espaço, do tempo e do corpo concorrem para um hibridismo definido entre o “cubo branco” museal e a “caixa preta” cinemática. O corpo do espectador, agora ativado pelo mecanismo projetivo, é aqui o centro da nossa discussão. Deve debater-se, pois, a correlação de linguagens diferentes, onde as artes visuais, as artes de palco, e a herança do cinema e do filme, confluem para a nossa proposta que visa, segundo os enunciados anteriores, propor a vídeo-instalação como terreno fértil da conclusão do “corpo projetado”. 

A construção da imagem cinemática ou videográfica equaciona o corpo em movimento.

Interessa dissecar, registar a oscilação dos corpos, os seus (des)equilíbrios, a sua verticalidade, a sua inevitabilidade térrea, esboçando uma “coreografia para a câmara”.

Trilhemos um caminho e consideremos algumas figuras que estão na génese dos conceitos acima explanados e outras que na contemporaneidade manifestam os mesmos pressupostos.

O projeto assume-se como um ensaio efetivo, um “colocar em cena” de toda uma investigação que se centra na performance, no corpo e numa sua imagem videográfica, equacionando um ciclo de exposições no contexto nacional e internacional, com a cooperação de várias Instituições como o MNAC – Museu Nacional de Arte Contemporânea (Museu do Chiado) e o MACE – Museu de Arte Contemporânea de Elvas – Coleção António Cachola.

 

PROGRAMA SEMANAL

 

5 A 9 MARÇO – Espelhos/Visões

Vito Acconci | Centers, 1971, 22’28”, som

Anthony Ramos | Balloon Nose Blow-Up, 1972, 11’18”, som

Joan Jonas | Left Side Right Side, 1972, 8’50”, som

Gary Hill | Solstice d’hiver, 1993, vídeo, cor, som, DVD, HI8, 60’

 

11 A 16 MARÇO – Corpus Delicti

Julião Sarmento | Parasite, vídeo, P&B, som, 2003 

Carolee Schneemann | Up to and Including her limits, 1976, 29′, som

Jemima Stehli | Photo Performance nº 30, com uma escultura de Larry Bell e o artísta Lewis Amar, 2005, vídeo, 41’

Marina Abramovic | Dragon Head 6, 1989, DVD, NTSC, cor, sem som, 29′ 57”, 2/5, dimensões variáveis

 

18 A 23 MARÇO – Lessness

João Onofre | Untitled, 1999, Video, cor, som, 3” loop (4:3), SDV, 190x210cm 

João Onofre | Untitled (We will never be boring), 1997, vídeo, cor, sem som, 60′ (4:3), SDV 233x308cm 

Bruce Nauman | Slow Angle Walk, 1968, 60’, som

Ana Pérez-Quiroga | Inventário – Diário #1 Phales, 2009, vídeo, cor, som, 3′

 

25 A 30 MARÇO – Monólogos (Processos)

Gary Hill | Mediations (towards a remake of soundings) 1979/86, vídeo (cor, som), U-matic / DVD, 4:17 (4:17 EA/Voyager), Edição 21/30 + 5 AP 

Nuno Sousa Vieira | Razão nº1, 2011, Estrutura de mesa em madeira de faia, tampo de MDF pintado a acrílico, vidros, primeiro livro razão da Fábrica de Plásticos Simala, fotocópias em papel A4, 140x200x150cm, vídeo transferido para DVD, cor e som, 8’10’’, Impressão a jato de tinta sobre papel de algodão 20×16,6cm. 

Nuno Sousa Vieira | Sight without Eyesight, vídeo, DVD, cor, 32’02’’, 2008

 

1 A 6 ABRIL – KDM Playground

João Tabarra | O encantador de serpentes, sem som, (16:9), 5’10’’, 2007

João Tabarra | Pose/Maquillage/Pose 2, 2004, vídeo, cor, sem som, 8’55’’, loop

João Onofre | Untitled (Masked tap dancer), som, 2005

Bruno Pacheco | Self-portrait smoking a cigar without the aid of the hands, 2002, vídeo, cor, sem som, 15’40’’ 

Mónica de Miranda | Biting nations, 2007, instalação vídeo, HD, cor, som

 

8 A 13 ABRIL – Pas de deux

Merce Cunningham e Charles Atlas | Merce by Merce by Paik: Part One: Blue Studio, 1975-76, 15’38’’, som

Johanna Billing | I’m lost without your rhythm, DVD, cor, som, 13’29’’ (loop), 2009

Johanna Billing | Graduate Show, cor, som, Beta/DVD, 3’20’’, 1999

 

15 A 20 ABRIL – Imagem-Texto

Vera Mantero | Curso de Silêncio (com Miguel Gonçalves Mendes), vídeo, DVD, cor, som, 2007 

Ana Rito | Poème-acte, filme 8mm transcrito para DVD, PAL, sem som, P&B, 2’, 2012-2013 

Ana Rito | AKTION, filme 8mm transcrito para DVD, PAL, sem som, P&B, 2’55’’, 2010 

Gary Hill | Goats and sheep, 1995-2001, vídeo, P&B, som, DVD

 

22 A 27 ABRIL – Le Grain de la Voix

Vasco Araújo | Far de Donna, 2005, vídeo, cor, som, 10’45’’

 

29 ABRIL A 4 MAIO – Close-up

Julião Sarmento | Faces, 1976, filme 8mm transferido para DVD, cor, sem som, 44’22’’

 

 

Ficha técnica

Conceito curatorial e Organização Ana Rito e Jacinto Lageira

“A VISÃO INCORPORADA – PERFORMANCE PARA A CÂMARA”

Ana Rito, Jacinto Lageira

 

The body is constantly and profoundly redrawn through the images created from it and that, somehow, return the reflection, transforming it in each look. This body crosses concepts, experiences theatricality, staging, choreography, gesture, movement and puts itself in a collision course with any attempt of a more classical coding. The paradox establishes the transmutable and unstable nature of the body and its images.


The videographic or cinematic body establishes a network of relationships which are linked to a notion of mirror, where concepts like the identity, gender, the double or the mask are studied according with a (de)construction logic. Giorgio Agamben states in his essay
Notes on Gesture that the element of cinema is the gesture and not the image. It is precisely between the two that we have established our thought. We are in the middle between the body and its image, observing the transition moments, of contact, suspension and hesitation. The image projection of the performative body in the space of the video installation is the genesis of our investigation/exhibition. Taking the image as the primordial matter of thought, an exhibition project is conceived which intends to establish its operative genesis from a statement that reflects on the presence and absence of the body. In A Visão Incorporada, it is the videographic or cinematic image that, recording the body, builds the concept of a “performance for the camera”, not presupposing that the actions are experienced live by an audience, thus allowing a conceptual mismatch which assists the definition of an elusive field and between worlds: the gestures are now “archives” of the body in transit. The figure, now formed, the body of the image (perhaps we may consider two bodies together, the body as a figure, and the own body of the video or film as a representation, as an “object”), establishes the transmutation and instability of the own image medium’s condition of moving images – in a film or a video. Looking for a transdisciplinary discourse between the body and its image, the present research project establishes a place and a language at the frontiers of classifications, codes and models. Frequently questioning how an unknown, what other thing, can emerge from the encounters between performance practice, contemporary dance, theater and cinematic experience, we can find a possible answer in the space of video installation and in the manifested hybridity in this process of metamorphosis, in the interstices of forms, in the intervals of bodies. What is interesting, for example, is the transition from the universe of the performance to the videographic one, the body in movement in dialogue with the cinematographic language, in an essential and continuous resonance. It is in the study and analysis of the structures inherent to the film and video, in its perceptual and cognitive dimensions, that one intuits a notion of a transforming spatiality of the viewer’s posture concerning the physical and architectural space. The questioning of space, time and body compete to a hybridism defined between the museum’s “white cube” and the cinematic “black box”. The viewer’s body, now activated by the projective mechanism, is the center of our discussion. The correlation between different languages must be discussed, where the visual arts, the scenic arts, and the cinema and film heritage, come together for our proposal which, according to the previous statements, proposes the video installation as a fertile ground for the fulfillment of the “projected body.”

The construction of the cinematic or videographic image equates the moving body.

What is interesting is to dissect, to register the bodies’ oscillation, their (un)balances, their verticality, their earthly inevitability, outlining a “choreography for the camera”.

Let’s make a way and consider some figures which are at the genesis of the concepts explained above and others that in contemporaneity manifest the same presuppositions.

The project stands itself as an effective test, like a “staging” of an entire research focusing on the performance, the body and on a possible videographic image of itself, equating a cycle of exhibitions in the national and international context, with the cooperation of several Institutions such as the MNAC – Museu Nacional de Arte Contemporânea (Chiado Museum) and the MACE – Museu de Arte Contemporânea de Elvas – Coleção António Cachola.

 

WEEKLY PROGRAM

 

5 TO MARCH 9 – Mirrors/Visions

Vito Acconci | Centers, 1971, 22’28”, sound

Anthony Ramos | Balloon Nose Blow-Up, 1972, 11’18”, sound

Joan Jonas | Left Side Right Side, 1972, 8’50”, sound

Gary Hill | Solstice d’hiver, 1993, video, colour, sound, DVD, HI8, 60’

 

11 TO MARCH 16 – Corpus Delicti

Julião Sarmento | Parasite, vídeo, P&B, sound, 2003 

Carolee Schneemann | Up to and Including her limits, 1976, 29′, sound

Jemima Stehli | Photo Performance nº 30, with a sculpture by Larry Bell and the artist Lewis Amar, 2005, video, 41’

Marina Abramovic | Dragon Head 6, 1989, DVD, NTSC, colour, no sound, 29′ 57”, 2/5, variable dimensions

 

18 TO MARCH 23 – Lessness

João Onofre | Untitled, 1999, Video, colour, sound, 3” loop (4:3), SDV, 190x210cm 

João Onofre | Untitled (We will never be boring), 1997, video, colour, no sound, 60′ (4:3), SDV 233x308cm 

Bruce Nauman | Slow Angle Walk, 1968, 60’, sound

Ana Pérez-Quiroga | Inventário – Diário #1 Phales, 2009, video, colour, sound, 3′

 

25 TO MARCH 30 – Monologues (Processes)

Gary Hill | Mediations (towards a remake of soundings) 1979/86, video (colour, sound), U-matic / DVD, 4:17 (4:17 EA/Voyager), Edition 21/30 + 5 AP 

Nuno Sousa Vieira | Razão nº1, 2011, Table structure in beechwood, MDF top painted with acrylic, glass, first book reason by Fábrica de Plásticos Simala, photocopies in A4 paper, 140x200x150cm, video transferred to DVD, colour and sound, 8’10’’, Inkjet printing in cotton paper 20×16, 6cm

Nuno Sousa Vieira | Sight without Eyesight, video, DVD, colour, 32’02’’, 2008

 

1 TO APRIL 6 – KDM Playground

João Tabarra | O encantador de serpentes, no sound, (16:9), 5’10’’, 2007

João Tabarra | Pose/Maquillage/Pose 2, 2004, video, colour, no sound, 8’55’’, loop

João Onofre | Untitled (Masked tap dancer), sound, 2005

Bruno Pacheco | Self-portrait smoking a cigar without the aid of the hands, 2002, video, colour, no sound, 15’40’’ 

Mónica de Miranda | Biting nations, 2007, video installation, HD, colour, sound

 

8 TO APRIL 13 – Pas de deux

Merce Cunningham and Charles Atlas | Merce by Merce by Paik: Part One: Blue Studio, 1975-76, 15’38’’, sound

Johanna Billing | I’m lost without your rhythm, DVD, colour, sound, 13’29’’ (loop), 2009

Johanna Billing | Graduate Show, colour, sound, Beta/DVD, 3’20’’, 1999

 

15 TO APRIL 20 – Image-Text

Vera Mantero | Curso de Silêncio (with Miguel Gonçalves Mendes), video, DVD, colour, sound, 2007 

Ana Rito | Poème-acte, 8mm film transferred to DVD, PAL, no sound, B&W, 2’, 2012-2013 

Ana Rito | AKTION, 8mm film transferred to DVD, PAL, no sound, B&W, 2’55’’, 2010 

Gary Hill | Goats and sheep, 1995-2001, video, B&W, sound, DVD

 

22 TO APRIL 27 – Le Grain de la Voix

Vasco Araújo | Far de Donna, 2005, video, colour, sound, 10’45’’

 

APRIL 19 TO MAY 4 – Close-up

Julião Sarmento | Faces, 1976, 8mm film transferred to DVD, colour, no sound, 44’22’’

 

 

Credits

Curatorial concept and Organization Ana Rito and Jacinto Lageira