“MEDO E FEMINISMOS”
Miguel Bonneville, Maria Gil
MEDO
Duas pessoas, que manifestam um saber arquivista sobre medos, estão sentadas lado a lado para evocar medos passados presentes e futuros, autobiográficos ou não. Medos que se transformam em medos sociológicos, em manifestações do controlo político que é exercido sobre a sociedade, sobre as pessoas. A partir dos conflitos internos de cada performer constrói-se uma apresentação fragmentada com direito a pequenos atos de sarar que não pretendem mais do que transformar veneno em remédio.
TENHO MEDO DE IR À SEGURANÇA SOCIAL
Tenho medo de ter dívidas enormes das quais não sei. Tenho medo de esperar infinitamente. Tenho medo de ligar para lá para marcar o meu lugar. Acho que só lá fui uma vez e gostava de nunca mais lá voltar. Tenho medo de assistir a cenas dramáticas e de pensar que não há nada que eu possa fazer. De pensar que a minha cena dramática acontecerá também, talvez só dentro do meu corpo. Que há milhões de pessoas em situações muito piores e que é absolutamente ridículo nascermos para isto, para sermos números e termos funções e para vivermos eternamente sob a tirania de um paizinho – de vários paizinhos – que nos fodem a torto e a direito. Prefiro pai nenhum a paizinhos destes e paizinhos daqueles.
FEMINISMOS
De forma nostálgica e pessoal evocam-se alguns dos momentos mais significativos para a arte da performance feminista, seguindo-se uma reflexão pessoal sobre a prática do feminismo nos dias de hoje. A palestra termina com a recriação de duas performances feministas do século XX.
Perguntei-lhe o que é que ela achava sobre a emancipação das mulheres e ela respondeu-me que achava bem, depois perguntei-lhe o que é que ela achava sobre as mulheres poderem exercer a sua sexualidade sem tabus e ela respondeu-me que achava bem, depois perguntei-lhe o que é que ela achava sobre a violência doméstica e de esta estar a aumentar com a crise, sobretudo nos jovens e ela respondeu-me que achava mal, e finalmente perguntei-lhe o que é que ela achava sobre o papel das feministas na sociedade e ela respondeu-me que as feministas pensam muito nelas, que são muito egoístas.
Ficha técnica
Direção Maria Gil
Cocriação Maria Gil, Miguel Bonneville
Apoio cénico Pedro Silva
Produção Teatro do Silêncio
Projeto apoiado pela Fundação Calouste Gulbenkian
“MEDO E FEMINISMOS”
Miguel Bonneville, Maria Gil
FEAR
Two people, who manifest an archival knowledge about fears, sit side by side to evoke past, present and future fears, autobiographical or not. Fears that turn into sociological ones, in expressions of the political control that is exerted onto society, onto people. From the internal conflicts of each performer is built a fragmented presentation with the right to small acts of healing which pretend nothing more than transforming poison into medicine.
I AM AFRAID TO GO TO THE SOCIAL SECURITY DEPARTMENT
I am afraid of having huge debts I do not know. I’m afraid to wait forever. I’m afraid to call them to make an appointment. I guess I only went there once and I would like to never go back there. I am afraid to witness dramatic situations and to think that there is nothing I can do. To think that my dramatic situation will also happen, maybe just inside my body. That there are millions of people in much worse situations and that it is absolutely ridiculous to be born into this, to be numbers and have functions and to live forever under the tyranny of a daddy – of several daddies – who fuck us anyway they can. I prefer no father at all to these daddies and daddies of those.
FEMINISMS
In a nostalgic and personal way, some of the most significant moments for the art of feminist performance are evoked, followed by a personal reflection on the practice of feminism nowadays. The lecture ends with the re-creation of two feminist performances of the twentieth century.
I asked her what she thought about the emancipation of women, and she agreed, then asked her what she thought about women being able to demonstrate their sexuality without taboos and she agreed once more, then I asked her what she thought about domestic violence and its increase due to the crisis, especially among young women, and she told me she felt bad, and finally I asked her what she thought about the role of feminists in society, and she replied that feminists think a lot about them, that they are very selfish.
Credits
Direction Maria Gil
Co-creation Maria Gil, Miguel Bonneville
Scenic support Pedro Silva
Production Teatro do Silêncio
Funding Fundação Calouste Gulbenkian