A programação do FUSO INSULAR nesta primeira mostra de videoarte em Ponta Delgada, a cargo do curador Delfim Sardo, apresenta obras em vídeo que vão desde os primórdios até os dias de hoje, valorizando a imagem em movimento como expressão artística transversal a todas as práticas, cruzando linguagens de filme experimental, da performance, da fotografia e do cinema. 

Divide-se em duas sessões, a primeira correspondente a uma visão retrospectiva e a segunda dedicada aos desenvolvimentos recentes das práticas da imagem videográfica.
À primeira dessas sessões deu-se o mote “do filme ao vídeo”, na medida em que os trabalhos apresentados são o resultado de percursos artísticos que, na década de 1970, nasceram do contexto da utilização de filme no ambiente conceptual e experimental que era o da época. Quer Fernando Calhau, quer Julião Sarmento ou Helena Almeida – como Vítor Pomar, Ângelo de Sousa, Palolo e outros, claramente conscientes do trabalho de Michael Snow, Stan Brackage ou Jonas Mekas, estavam atentos aos desenvolvimentos do cinema experimental.
A perda de narrativa, o interesse pela documentação de uma situação, a ausência de expressividade dramática e o abdicar de processos de edição que gerassem algum tipo de diegese fílmica – a criação de um espaço-tempo ilusionista e envolvente para o espectador –, são traços fundamentais destes trabalhos pioneiros do uso de imagem em movimento por artistas visuais em Portugal. Em rigor, estes filmes experimentais não são vídeos, mas isso deve-se à falta de ferramentas tecnológicas e disponibilidade financeira que só chegaria com o acesso a equipamento providenciado pela Secretaria de Estado da Cultura, já no final da década. No entanto, a sua estrutura e o foco na apresentação de uma acção (a que poderíamos chamar performance) indicam já a tipologia dos chamados “task videos”, os vídeos que documentam a execução de tarefas, que ocuparam muitos dos usos videográficos no dealbar da década seguinte.
A segunda sessão, precisamente com o reverso do tema anterior, foca-se num conjunto de artistas que, usando o vídeo, apontam para um caminho que é fílmico, ou mais precisamente, cinemático. O horizonte destes trabalhos, muito diversos entre e pertencendo a linhagens muito diferentes, dialogam por diversas formas com o cinema, fazendo deste o seu destino. Nalguns casos – de que Filipa César é um exemplo claro – o caminho viria a centrar-se realmente em processos cinemáticos,
no seu caso reflexivos até em relação a contextos específicos (coloniais ou derivados das lutas de libertação) da produção fílmica. Assim, centrando-se na última década e meia, os trabalhos apresentados de João Onofre, Tatiana Macedo (que apresenta uma versão de screening de uma instalação), Rui Calçada Bastos, Von Calhau, Nuno Cera e Filipa Cesar, não só apontam para o cinema como o seu destino, como nos convocam memórias cinematográficas. 

FUSO INSULAR 2019