“MISSED-EN-ABÎME”

ROGÉRIO NUNO COSTA

ENGLISH

 

Em 1917, Marcel Duchamp escreve “1917” num urinol virado ao contrário. Em 1919, desenha um bigode no mais importante retrato da história da arte, não o original (ele não é Banksy), nem sequer uma reprodução (a Pop não havia ainda sido inventada), antes um retrato que ele próprio pintou, assim copiando o original e, ao fazê-lo, quase repetindo Melville: I would prefer not to. Em 1921, Man Ray fotografa Duchamp enquanto Rrose Sélavy, fechando o ciclo, ou então abrindo o caminho para o desaparecimento do artista por trás do retrato.

Um século depois, ainda não sabemos relacionar-nos, histórica ou artisticamente, com a radicalidade de tais gestos, ora descredibilizando-os (ou procurando-lhes novas autorias), ora atribuindo-lhes uma qualquer intransponibilidade ou irresolução histórica. MISSED-EN-ABÎME quer falar sobre um gesto (centenário) que pode ser lido enquanto destruição, revelação, ou simplesmente ostracismo auto-imposto, como se fosse impossível fazer seja o que for depois de se ter obliterado (quase) tudo. Duchamp terá passado décadas da sua vida a fazer nada, razão pela qual Enrique Vila-Matas lhe terá dedicado algumas notas no seu romance dos autores-do-não (“Bartleby & Cia.”, 2000): « Uma vez, em Paris, o artista Naum Gabo pergunta a Marcel Duchamp porque havia ele parado de pintar. “Mais que voulez-vous?”, responde Duchamp, levantando os braços no ar. “Je n’ai plus d’idées!” ». A partir deste impasse, e através da ritualização de um isolacionismo queer e sacrificial, MISSED-EN-ABÎME atreve-se a revisitar a negligência de Duchamp, não para lhe atribuir uma solução — « …parce qu’il n’y a pas de problème » —, antes para aceitar o insucesso, o afastamento, a invisibilidade e o esquecimento, quiçá o desaparecimento, não como rituais de vitimização ou opressão auto-infligida, mas enquanto gestos de resistência/sobrevivência.O projeto, subintitulado “Psicobiografia de um Herói Perdedor (1917-1921)”, contempla um dispositivo tripartido (performance/instalação, livro e filme) pensado para o espaço do museu de arte contemporânea, assim concluindo um percurso investigativo em torno da tríade Arte-História-Solidão realizado por Rogério Nuno Costa em colaboração com artistas e pensadorxs de Portugal e da Finlândia.

Bio

Amares, 1978. Performer, investigador, professor e escritor, desenvolve trabalho artístico transdisciplinar. Vive e trabalha entre Portugal e a Finlândia. Apresenta espetáculos, performances, conferências e textos ensaísticos que exploram os campos do teatro, dança, artes visuais e literatura. Com formação académica em Comunicação Social, História da Arte Contemporânea e Cultura Contemporânea & Novas Tecnologias, desenvolve atualmente investigação em Visual Cultures, Curating and Contemporary Art na Aalto University (Finlândia) e no Grupo de Investigação em Estudos Performativos da Universidade do Minho. Como intérprete, co-criador e colaborador artístico, trabalhou com Mariana Tengner Barros, Patrícia Portela, Teatro Praga, Sónia Baptista, Lúcia Sigalho, Teresa Prima, Joclécio Azevedo, Susana Mendes Silva, entre outros. Colaborador assíduo da companhia Estrutura. Faz curadoria para projetos artísticos e educacionais. Professor Assistente Convidado na licenciatura em Teatro da Universidade do Minho (Guimarães). Leccionou na Escola Superior de Artes e Design (Caldas da Rainha) e ArtEZ University of the Arts (Arnhem). Trabalha com vários artistas na condição de coordenador editorial e dramaturgo. Dirige o projeto documental do Ballet Contemporâneo do Norte, estrutura na qual é artista associado. Desde 1999, o seu trabalho já foi apresentado em Portugal, França, Reino Unido, Bélgica, Países Baixos, Alemanha, Croácia, Finlândia, Roménia e Canadá.www.rogerionunocosta.com

Ficha técnica

Criação, direção, edição e performance Rogério Nuno Costa

Produção Inês Carvalho Lemos

Disposição cénica Luís Lázaro Matos

Desenho de luz e direção técnica Kristian Palmu

Arte sonora Niko Skorpio

Dramaturgia de movimento Pie Kär

Design gráfico Jani Nummela

Workshop e apoio dramatúrgico Colectivo FACA (Andreia Coutinho e Maribel Sobreira)

Fotografia de cena Miguel Refresco

Apoio ao vídeoMário Jerónimo Negrão

Co-produção Teatro Viriato MUDAS. Museu de Arte Contemporânea da Madeira

Residências Rua das Gaivotas 6, Là-Bas Studio/KaapelitehdasAalto University (School of Arts, Design and Architecture) Cité Internationale Universitaire de Paris – Maison du Portugal Campus Paulo e Silva

Pré-apresentações Museum of Impossible Forms (Helsínquia, 2018)Maison du Portugal/Parfums de Lisbonne (Paris, 2021)Estreia Serralves Museu de Arte Contemporânea (Porto)DigressãoFestival Contradança (Covilhã) Festival Temps d’Images/Museu Coleção Berardo (Lisboa) Teatro Viriato (Viseu) Chão de Oliva/Festival Periferias (Sintra) Teatro-Cine de Torres Vedras MUDAS (Madeira)

Projecto financiado pela República Portuguesa– Direção-Geral das Artes.

“MISSED-EN-ABÎME”

ROGÉRIO NUNO COSTA

 

Em 1917,Marcel Duchamp writes “1917” in an upside down urinal. In 1919, he draws a moustache in the most important portrait of the history of art; not the original one (he’s not Banksy), not even a reproduction (Pop was yet to be invented), but a portrait he painted himself, copying the “original”, and, by doing so, almost repeating Melville: I would prefer not to. In 1921, Man Ray photographs Duchamp as Rrose Sélavy, thus completing the circle, or else paving the way for the artist’s disappearance.

A century later, we still don’t know how to deal, historically and artistically, with these radical endeavours, sometimes discrediting them (or assigning them new authorships…), sometimes assuming a somewhat insurmountable historical irresolution for them. MISSED-EN-ABÎME aims to talk about a (centennial) gesture which can be interpreted as destruction, revelation, or simply self-imposed ostracism, as if it was impossible to do anything more after having obliterated (almost) everything. Duchamp spent decades doing nothing, the reason why Enrique Vila-Matas decided to dedicate some footnotes to him in his novel about the negative authors (“Bartleby & Cia.”, 2000): « One time, in Paris, artist Naum Gabo asks Marcel Duchamp the reason for having stopped painting. “Mais que voulez-vous?”, answers Duchamp, raising his arms in the air. “Je n’ai plus d’idées!” ». Inspired by this impasse, MISSED-EN-ABÎME ritualizes a queer, sacrificial isolationism, thus daring to revisit Duchamp’s negligence while avoiding to find it a solution — « …parce qu’il n’y a pas de problème » —, rather accepting failure, withdrawal, invisibility and oblivion, perhaps also disappearance, as acts of survival and resistance.

Subtitled “Psychobiography of a Losing Hero (1917-1921)”, this piece consists in a three-part display (performance/installation, book and film) meant to be shown in the space of the contemporary art museum, thus concluding a research process on Art-History-Solitude conducted by Rogério Nuno Costa in collaboration with artists and thinkers from Portugal and Finland.

Amares, 1978. Performer, researcher, teacher and writer, develops cross-disciplinary artistic work. Lives and works between Portugal and Finland. His performances, lectures and texts explore the fields of theatre, dance, visual arts and literature. He has studied Social Communication, Contemporary Art History and Contemporary Culture & New Technologies, currently doing research in Visual Cultures, Curating and Contemporary Art at Aalto University (Finland) and as part of the Performance Studies Research Group in Minho University. Has worked as performer, collaborator and artistic consultant with the artists Mariana Tengner Barros, Patrícia Portela, Teatro Praga, Sónia Baptista, Lúcia Sigalho, Teresa Prima, Joclécio Azevedo, Susana Mendes Silva, among others. Frequent collaborator of theatre company Estrutura. Has curated many artistic and educational projects. Guest Assistant Professor in the Bachelor in Theatre at Minho University (Guimarães). He has also taught in the Arts and Design Superior School (Caldas da Rainha) and ArtEZ University of the Arts (Arnhem). Works with many artists as editor and dramaturgist. Directs the documental project of Ballet Contemporâneo do Norte, where he is also an associated artist. Starting in 1999, his work has already been shown in Portugal, France, UK, Belgium, The Netherlands, Germany, Croatia, Finland, Romania and Canada.

www.rogerionunocosta.com

Credits

Creation, direction, editing and performance Rogério Nuno Costa

Production Inês Carvalho Lemos

Set display Luís Lázaro Matos

Light design & technical direction Kristian Palmu

Sound art Niko Skorpio

Dramaturgical movement Pie Kär

Graphic design Jani Nummela

Workshop and dramaturgical support Colectivo FACA (Andreia Coutinho e Maribel Sobreira)

Stage photography Miguel Refresco

Video support Mário Jerónimo Negrão

Coproduction Teatro Viriato MUDAS. Museu de Arte Contemporânea da Madeira

Residencies Rua das Gaivotas 6, Là-Bas Studio/KaapelitehdasAalto University (School of Arts, Design and Architecture) Cité Internationale Universitaire de Paris – Maison du Portugal Campus Paulo e Silva

Premiere Museum of Impossible Forms (Helsínquia, 2018)Maison du Portugal/Parfums de Lisbonne (Paris, 2021)Estreia Serralves Museu de Arte Contemporânea (Porto)

Tour Festival Contradança (Covilhã) Festival Temps d’Images/Museu Coleção Berardo (Lisboa) Teatro Viriato (Viseu) Chão de Oliva/Festival Periferias (Sintra) Teatro-Cine de Torres Vedras MUDAS (Madeira)

Project funded by Governo de Portugal – Direção-Geral das Artes